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Description of epidemics of coffee rust with neural networks

Descrição da epidemia da ferrugem do cafeeiro com redes neuronais

Abstracts

The objective of this paper was to evaluate the potential of neural networks (NN) as an alternative method to the basic epidemiological approach to describe epidemics of coffee rust. The NN was developed from the intensities of coffee (Coffea arabica) rust along with the climatic variables collected in Lavras-MG between 13 February 1998 and 20 April 2001. The NN was built with climatic variables that were either selected in a stepwise regression analysis or by the Braincel® system, software for NN building. Fifty-nine networks and 26 regression models were tested. The best models were selected based on small values of the mean square deviation (MSD) and of the mean prediction error (MPE). For the regression models, the highest coefficients of determination (R²) were used. The best model developed with neural networks had an MSD of 4.36 and an MPE of 2.43%. This model used the variables of minimum temperature, production, relative humidity of the air, and irradiance 30 days before the evaluation of disease. The best regression model was developed from 29 selected climatic variables in the network. The summary statistics for this model were: MPE=6.58%, MSE=4.36, and R²=0.80. The elaborated neural networks from a time series also were evaluated to describe the epidemic. The incidence of coffee rust at four previous fortnights resulted in a model with MPE=4.72% and an MSD=3.95.


O presente trabalho avaliou o potencial das redes neuronais como método alternativo aos sistemas fundamentais para descrever a epidemia da ferrugem do cafeeiro (Coffea arabica). As redes neuronais foram elaboradas com dados da incidência da ferrugem do cafeeiro, coletados em Lavras de 13/02/1998 a 20/04/2001. As variáveis climáticas precipitação, número de dias com e sem precipitação pluvial, umidade relativa média do ar, horas de insolação, temperaturas máxima, média e mínima, lâmina de água de irrigação e produção foram utilizadas para construir as redes e elaborar equações de regressão. Essas variáveis foram selecionadas pela análise de regressão 'stepwise' ou pelo sistema Braincel®. Séries temporais da incidência da doença também foram empregadas na elaboração de redes. Foram testadas 59 redes e 26 modelos de regressão. A escolha dos melhores modelos baseou-se nos menores valores do quadrado médio do desvio (QMD) e erro médio de previsão (EMP). Para os modelos ajustados pela regressão, também foi considerado o maior valor do coeficiente de determinação (R²). O melhor modelo de rede neuronal apresentou QMD=3,43 e EMP=1,17% e incluiu as variáveis temperatura mínima, umidade relativa do ar, produção e insolação, coletadas 30 dias antes da data de avaliação. O melhor modelo ajustado pela análise de regressão foi desenvolvido com 29 variáveis climáticas selecionadas na elaboração da rede e apresentou EMP=6,58%, QMD=4,36 e R²=0,80. As redes neuronais elaboradas a partir de séries temporais também foram adequadas para descrever a epidemia e têm grande possibilidade de emprego para descrever epidemias. As observações da incidência das quatro quinzenas anteriores resultaram em um modelo com EMP=4,72% e QMD=3,95.

inteligência artificial; epidemiologia; Hemileia vastatrix; Coffea arabica


DESCRIÇÃO DA EPIDEMIA DA FERRUGEM DO CAFEEIRO COM REDES NEURONAIS* * Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor. Universidade Federal de Lavras (2001). ** Bolsista do CNPq

AUGUSTO CARLOS S. PINTO1** * Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor. Universidade Federal de Lavras (2001). ** Bolsista do CNPq , EDSON A. POZZA2, PAULO E. DE SOUZA2, ADÉLIA A. A. POZZA3, VIVIANE TALAMINI2, JULIANA M. BOLDINI2, FLORISVALDA S. SANTOS2

1Instituto Mineiro de Agropecuária, Av. dos Andradas, 1220, CEP 36120-010, Belo Horizonte-MG, 2Departamento de Fitopatologia, e-mail: eapozza@ufla.br; 3Departamento de Ciência do Solo da Universidade Federal de Lavras, Cx. Postal 37, CEP 37200-000, Lavras, MG, fax (35) 3829-1283

(Aceito para publicação em 25/06/2002)

Autor para correspondência: Edson A. Pozza

RESUMO

O presente trabalho avaliou o potencial das redes neuronais como método alternativo aos sistemas fundamentais para descrever a epidemia da ferrugem do cafeeiro (Coffea arabica). As redes neuronais foram elaboradas com dados da incidência da ferrugem do cafeeiro, coletados em Lavras de 13/02/1998 a 20/04/2001. As variáveis climáticas precipitação, número de dias com e sem precipitação pluvial, umidade relativa média do ar, horas de insolação, temperaturas máxima, média e mínima, lâmina de água de irrigação e produção foram utilizadas para construir as redes e elaborar equações de regressão. Essas variáveis foram selecionadas pela análise de regressão 'stepwise' ou pelo sistema Braincelâ. Séries temporais da incidência da doença também foram empregadas na elaboração de redes. Foram testadas 59 redes e 26 modelos de regressão. A escolha dos melhores modelos baseou-se nos menores valores do quadrado médio do desvio (QMD) e erro médio de previsão (EMP). Para os modelos ajustados pela regressão, também foi considerado o maior valor do coeficiente de determinação (R2). O melhor modelo de rede neuronal apresentou QMD=3,43 e EMP=1,17% e incluiu as variáveis temperatura mínima, umidade relativa do ar, produção e insolação, coletadas 30 dias antes da data de avaliação. O melhor modelo ajustado pela análise de regressão foi desenvolvido com 29 variáveis climáticas selecionadas na elaboração da rede e apresentou EMP=6,58%, QMD=4,36 e R2=0,80. As redes neuronais elaboradas a partir de séries temporais também foram adequadas para descrever a epidemia e têm grande possibilidade de emprego para descrever epidemias. As observações da incidência das quatro quinzenas anteriores resultaram em um modelo com EMP=4,72% e QMD=3,95.

Palavras-chave adicionais: inteligência artificial, epidemiologia, Hemileia vastatrix, Coffea arabica.

ABSTRACT

Description of epidemics of coffee rust with neural networks

The objective of this paper was to evaluate the potential of neural networks (NN) as an alternative method to the basic epidemiological approach to describe epidemics of coffee rust. The NN was developed from the intensities of coffee (Coffea arabica) rust along with the climatic variables collected in Lavras-MG between 13 February 1998 and 20 April 2001. The NN was built with climatic variables that were either selected in a stepwise regression analysis or by the Braincelâ system, software for NN building. Fifty-nine networks and 26 regression models were tested. The best models were selected based on small values of the mean square deviation (MSD) and of the mean prediction error (MPE). For the regression models, the highest coefficients of determination (R2) were used. The best model developed with neural networks had an MSD of 4.36 and an MPE of 2.43%. This model used the variables of minimum temperature, production, relative humidity of the air, and irradiance 30 days before the evaluation of disease. The best regression model was developed from 29 selected climatic variables in the network. The summary statistics for this model were: MPE=6.58%, MSE=4.36, and R2=0.80. The elaborated neural networks from a time series also were evaluated to describe the epidemic. The incidence of coffee rust at four previous fortnights resulted in a model with MPE=4.72% and an MSD=3.95.

INTRODUÇÃO

O café (Coffea arabica L.) é a principal "commodity" de exportação do Brasil (Agrianual, 2001) e a ferrugem ocasionada por Hemileia vastatrix Berk & Br. constitui a principal doença do cafeeiro (Mendes & Guimarães, 1997; Zambolim et al., 1997; Juliatti & Silva, 2001). As perdas devido a essa doença podem chegar a 30% da produção se nenhuma medida de controle for tomada, causando prejuízos em torno de US$ 1 a 2 bilhões anualmente (Kushalappa & Eskes, 1989; Zambolim et al., 1997).

Para melhor entender a epidemia da doença, foram desenvolvidos sistemas fundamentais ou explicativos (Akutsu, 1981; Kushalappa et al., 1984). Tais sistemas basearam-se nos estudos das relações das condições biológicas e de ambiente, as quais governam a interação patógeno-hospedeiro. Uma alternativa aos modelos desenvolvidos por métodos matemáticos, embora ainda pouco utilizada em fitopatologia, são as redes neuronais (RN). Elas apresentam grande potencial no reconhecimento de padrões e previsão de séries temporais, por oferecer método flexível e mais próximo dos processos biológicos (Zahedi, 1991; Silva & Silva, 1995; Turban, 1995; Pozza, 1998). O maior ajuste aos sistemas biológicos é devido a capacidade de detectar pequenas mudanças no comportamento do sistema, por exemplo a mudança na taxa de progresso de uma série temporal, fato comum em epidemiologia botânica (Pozza, 1998). As RN são sistemas de inteligência artificial capazes de simular os mecanismos de aprendizado do cérebro humano (Mizubuti et al., 1994; Pozza, 1998; Pozza et al., 1999). São constituídas por neurônios artificiais ou elementos de processamento. As redes apresentam-se divididas em camadas de entrada, intermediária e de saída. Na camada de entrada os elementos de processamento são chamados de 'input' e na de saída de 'output'. O conjunto de observações ou os dados coletados a partir de um fenômeno deverão ser divididos em cerca de 75% para treinar e 25% para validar as RN desenvolvidas (Turban, 1995).

Empregadas nas mais diversas áreas de conhecimento, as primeiras aplicações das RN na agropecuária datam do início da década de 1990. Foram empregadas como ferramentas para identificar fungos apodrecedores de madeira (Morris et al., 1992), em sistema de identificação de imagens de raízes no solo (Nater et al., 1992), na classificação, por olhos mecânicos, de ovos destinados à incubação (Das & Evans, 1992) e no controle de nutrientes em culturas hidropônicas (Honjo & Takakura, 1991).

Em fitopatologia as RN foram aplicadas para quantificar e prever doenças, como também descrever epidemias. Assim, uma RN foi usada por Ruan et al. (1998) para quantificar o porcentual de sementes de trigo (Triticum aestivum L.) com a mancha de giberela [Giberella zeae (Schwein.) Petch]. Um total de 55 características de cor e textura foi extraído de imagens capturadas por um sistema de olhos mecânicos ("Machine Vision" - MV). Para treinar e validar as redes foram utilizadas 142 e 38 amostras, respectivamente, com níveis de infecção variando de 0 a 41%. As amostras também foram avaliadas por três especialistas. A porcentagem de sementes infetadas, estimada pela RN/MV, apresentou um coeficiente de correlação de 97% com os valores reais das amostras, sendo mais acurada em comparação aos especialistas.

De Wolf & Francl (2000) utilizaram as RN para prever a ocorrência da mancha amarela [Pyrenophora tritici-repentis (Died.) Drechs.] e da mancha de Stagonospora [Phaeosphaeria nodorum (E. Muller) Hedjaroude] em trigo. Foram correlacionados os dados dos períodos de infecção dos patógenos em plantas suscetíveis com temperatura, umidade relativa, duração do molhamento foliar, precipitação e crescimento em graus dias acumulados, medidos em campo no período de 1993 a 1998. Foram observados 202 períodos favoráveis à ocorrência de doenças. Desse total, 152 foram usados para treinar a rede, sendo os demais empregados na validação. Os melhores modelos de RN classificaram corretamente 82% e 84% dos períodos de incidência de mancha amarela e mancha de Stagonospora, respectivamente.

A aplicabilidade de RN para descrever a epidemia de ferrugem do feijoeiro [Uromyces appendiculatus (Pers.) Unger] foi testada por Mizubuti et al. (1994). Os componentes de resistência (período latente médio, freqüência de infecção, diâmetro de pústulas e intensidade de esporulação), avaliados em 18 cultivares de feijão (Phaseolus vulgaris L.), foram utilizados como dados de entrada da rede ('inputs'); como dados de saída ('output'), a área abaixo da curva de progresso da doença (AACPD) e a taxa de progresso (K ou r). A precisão entre os dados estimados pelas RN e os observados em campo foi de 0,99 e 0,92, para K e AACPD, respectivamente, com tolerância de 0,05.

O potencial de aplicação das RN para descrever a epidemia da vassoura-de-bruxa [Crinipelis perniciosa (Stahel) Singer] em cacaueiro (Theobroma cacau L.) foi estudado por Pozza (1998), utilizando dados coletados em Altamira - PA, entre janeiro de 1986 e dezembro de 1987. A partir de 16 variáveis climáticas, produção de basidiocarpos e intensidade da doença, foram construídas 100 RN e testados 37 modelos de regressão. A melhor RN foi aquela construída com 11 variáveis climáticas na nona semana anterior à ocorrência da intensidade da doença. Pela comparação dos quadrados médios dos desvios (QMD) e erro médio de previsão (EMP), as RN descreveram a doença com maior eficiência, quando comparadas com as equações de regressão, principalmente para a intensidade da doença. Para descrever a produção de basidiocarpos, a RN construída com a variável duração da precipitação pluvial, em horas (DPPT), apresentou o menor EMP (12,56%).

Assim, considerando os resultados alcançados em outros patossistemas, a importância da ferrugem do cafeeiro, a flexibilidade das RN em ajustar dados a partir de sistemas dinâmicos, de ajustar melhor os dados estimados aos observados e de reduzir erros de previsão, o presente trabalho teve como objetivo avaliar as redes neuronais para descrever a epidemia da ferrugem do cafeeiro.

MATERIAL E MÉTODOS

Os dados utilizados foram coletados por Talamini (1999) referentes a avaliações quinzenais da incidência da ferrugem no período de 13/02/1998 a 20/04/2001. O experimento foi conduzido em área experimental da Universidade Federal de Lavras, localizada em Lavras, MG, em altitude de 918 m, latitude sul de 21°14' e longitude oeste de 45°00'. Foi avaliada a incidência da doença em oito folhas por planta, quatro de cada lado, no terço médio da planta, no 3o ou 4o par de folhas dos ramos plagiotrópicos, totalizando oito plantas por parcela. A cultivar avaliada foi a Acaiá Cerrado MG 1474, espaçamento de 3,0 m entre linhas e 0,60 m entre plantas. No início da avaliação, as plantas estavam com um ano e dois meses de idade. O experimento foi implantado, com quatro repetições, para avaliar a influência de cinco lâminas de irrigação (0, 40, 60, 80 e 100% da evaporação do tanque classe A) e três parcelamentos de adubação (três, seis e nove vezes) na intensidade da ferrugem e produção do cafeeiro.

Os dados climáticos, a partir de 60 dias antes do início das avaliações foram coletados, diariamente, na estação climatológica da UFLA. Foram obtidos os dados de precipitação em mm (PP), umidade relativa média do ar, em % (UR), horas de insolação (IN), temperaturas máxima (Tma), média (Tme) e mínima (Tmi), em ºC.

A partir desses dados foram calculadas as médias dos últimos 15, 30, 45 e 60 dias anteriores às avaliações da incidência de ferrugem. Para precipitação, foi calculado o somatório nos períodos. Também foram calculadas as variáveis: número de dias com (DCP) e sem precipitação pluvial (DSP). Para identificar as variáveis, foram utilizados índices referentes aos períodos anteriores à avaliação da incidência da ferrugem, por exemplo PP15, IN30 e Tme45. Foi introduzida nas RN e nos modelos de regressão a variável produção (PD), a qual assumiu valores zero (0) para as plantas antes do início da produção e um (1) em fase de produção.

Desenvolvimento das redes neuronais e análise de regressão múltipla

As RN foram desenvolvidas com o 'software' BRAINCELâ (Promissed Land Tecnologies, Inc.), versão 3.0, executado em microcomputador compatível com padrão IBM-PC, processador de 350 Mhz e 64 Mb de memória RAM. O erro de previsão da rede foi estipulado em 5%. O Braincelâ selecionou as variáveis com melhor ajuste para as redes neuronais. Para isso foram fornecidos ao programa o número máximo de camadas intermediárias (1 a 6) e o erro máximo de 5% durante o treinamento ou aprendizado da rede. O número de elementos de processamento foi definido pelo programa, sempre com o objetivo de encontrar o menor erro. O algoritmo utilizado no treinamento da rede foi o 'backpropagation'. Na expectativa de encontrar melhor ajuste das variáveis nas equações de regressão e, também nas redes, as variáveis selecionadas na análise de regressão foram utilizadas para construir RN e vice-versa.

Com o objetivo de comparar as RN com modelos explicativos foram desenvolvidas equações de regressão múltipla. As variáveis dependentes e independentes utilizadas em cada modelo serão descritas a seguir. Na análise de regressão as variáveis foram selecionadas no procedimento 'stepwise'. As variáveis selecionadas deveriam ser significativas a 5% de probabilidade pelo teste t. As melhores equações de regressão foram selecionadas pelo coeficiente de determinação (R2) e pela significância da regressão no teste F (P < 0,05 e P < 0,01).

Para a escolha das melhores redes e para comparar as RN com as equações de regressão foram empregados o erro médio de previsão (EMP) e o quadrado médio dos desvios (QMD):

em que åin é o somatório de i até n; Xobs é o valor da incidência da ferrugem; Xcalc o valor calculado pela equação de regressão ou rede neuronal e "n" o número de observações.

Redes neuronais e análise de regressão para descrever a incidência da ferrugem, utilizando variáveis climáticas selecionadas aos 15, 30, 45 e 60 dias antes da avaliação da doença

Foram desenvolvidas RN e construídos modelos de regressão para cada período anterior à avaliação da doença, ou seja, 15, 30, 45 e 60 dias, os quais foram submetidos a dois procedimentos. No primeiro foram utilizadas todas as variáveis para treinar a RN, empregando-se as opções dadas pelo sistema de procura da melhor rede e das melhores variáveis de entrada ou 'inputs'. Assim, a camada de entrada foi formada pelas variáveis climáticas mais a de produção (independentes) citadas anteriormente e a de saída ou 'output', pela variável dependente "incidência da ferrugem" (Figura 1). Nessa fase, foram utilizados os valores de incidência da ferrugem correspondentes aos níveis do fator experimental "lâmina de irrigação", totalizando cinco observações em cada data de avaliação. Definidos os melhores 'inputs', esses foram organizados em nova planilha para a análise de regressão múltipla e para o teste da rede.


Tanto para elaborar os modelos de regressão múltipla quanto para construir as redes, em cada, avaliação foram obtidos quatro valores de incidência da doença. A partir daí foram utilizados 75% dos dados para treinar a rede (fase de aprendizado) e 25% para validar os modelos.

Para avaliar a influência das variáveis selecionadas pela RN sobre a incidência da ferrugem, utilizou-se o seguinte modelo de regressão:

A variável dependente Y é a incidência da ferrugem; V1, V2..., são as variáveis, no máximo nove (PP, UR, IN,....n), selecionadas pela RN e b1, b2, ..., b9 são os coeficientes de regressão parcial.

No segundo procedimento, foram selecionadas as variáveis independentes por meio da análise de regressão múltipla 'stepwise', utilizando modelo semelhante ao anterior. As variáveis mantidas no modelo foram então utilizadas para treinar as novas RN. Nesse caso, foram definidas duas camadas intermediárias, contendo seis e três elementos de processamento.

Redes neuronais e análise de regressão para descrever a incidência da ferrugem, utilizando simultaneamente variáveis climáticas selecionadas aos 15, 30, 45 e 60 dias antes de avaliar a doença

Também foram desenvolvidos modelos para análise conjunta de todos os períodos, ou seja, avaliando todas as variáveis coletadas aos 15, 30, 45 e 60 dias antes de avaliar a incidência da doença. O procedimento de seleção das variáveis foi idêntico ao anterior. Selecionaram-se variáveis a partir da regressão 'stepwise' as quais foram utilizadas para desenvolver as RN e vice-versa.

Na avaliação das variáveis selecionadas pela RN foi utilizado o seguinte modelo de regressão:

As variáveis climáticas PD15, PP15 e DSP60 foram coletadas dos 15 aos 60 dias anteriores a avaliação da incidência da doença, selecionadas pela RN, e b1, b2, ..., b33 são os coeficientes de regressão parcial.

Além disso, foram avaliadas séries temporais para descrever a epidemia da ferrugem do cafeeiro. Utilizou-se um modelo recursivo, conforme descrito por Pozza (1998) e Silva & Silva (1995), no qual a incidência de ferrugem em determinado período ('output') seria explicada pela incidência avaliada na primeira, segunda, terceira, quarta ou quinta avaliação(ões) anterior(es).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na avaliação das RN para descrever a epidemia da ferrugem foram construídas 59 redes e realizadas 26 análises de regressão. O tempo total de treinamento das redes foi de 26 h e 34 min.

Redes neuronais e análise de regressão para descrever a incidência da ferrugem, utilizando variáveis climáticas selecionadas aos 15, 30, 45 e 60 dias antes da avaliação da doença

Na elaboração das RN pelo Braincelâ, as variáveis PD e UR foram selecionadas em todos os períodos. A variável IN foi excluída apenas para o período de 15 dias e Tme apenas para o de 60 dias anteriores à avaliação da incidência da doença. As RN, nesse caso, apresentaram topologia simples, com uma camada intermediária. A maior rede apresentou a topologia 6-4-1.

Os coeficientes de determinação (R2) dos modelos ajustados pela análise de regressão, das variáveis selecionadas pelo Braincelâ, foram baixos, variaram de 0,57 a 0,64. Esses valores demonstraram a inadequação dos modelos matemáticos testados para explicar, por meio das variáveis selecionadas pelo Braincelâ, a epidemia da ferrugem. Os modelos utilizados foram relativos a polinômios de primeiro grau. Outros modelos de regressão múltipla poderão ser avaliados para ajustar melhor o progresso temporal da epidemia, incluindo variáveis quadráticas, as quais poderão ajustar-se melhor ao patossistema, no entanto, a complexidade para avaliar e construir um modelo com grande número de variáveis independentes e suas diferentes combinações seria praticamente impossível. Apenas PD e IN permaneceram em todos os modelos ajustados pela regressão. A presença da variável IN pode ser devido ao maior período de insolação coincidir com a maior intensidade da ferrugem. Além disso, a germinação dos esporos é máxima na ausência de luz, intermediária na presença de luz difusa e nula sob luz direta (Montoya & Chaves, 1974).

Chaves et al. (1970) e Montoya & Chaves (1974) relacionaram maior enfolhamento e produtividade com maior intensidade da doença, o que justifica a presença da variável PD nos modelos. As variáveis Tmi e PP, selecionadas em alguns períodos pelo Braincelâ, não entraram nos modelos ajustados pela regressão. Para o período de 60 dias anteriores à avaliação, todas as variáveis selecionadas foram mantidas no modelo matemático.

Nos modelos ajustados pela análise de regressão 'stepwise' os coeficientes de determinação também foram baixos e variaram de 0,55 a 0,60. As variáveis PD, IN e UR foram mantidas em todos os modelos ajustados. Provavelmente a variável UR, significativa em todos períodos, teve relação com a presença e duração do molhamento foliar e favoreceu a maior germinação dos uredosporos de H. vastatrix. Essa correlação foi verificada por Akutsu (1981), Chalfoun, (1997) e Talamini, (1999).

Embora seja conhecida a importância da temperatura e da precipitação para a ferrugem (Chalfoun, 1997; Talamini, 1999), as variáveis Tme e PP não foram incluídas nos modelos ajustados pela análise de regressão. Por outro lado, a presença das variáveis Tmi nos períodos mais curtos, aos 15 e 30 dias anteriores à avaliação da doença, e Tme nos mais longos, pode ser relacionada à influência da temperatura nos períodos de incubação. As RN foram mais eficientes para descrever a incidência da ferrugem, pois apresentaram, em relação às regressões, menores QMD. Também apresentaram menores EMP, exceto a desenvolvida para o período de 60 dias (Tabela 1). As RN, por detectar com maior eficiência a mudança na taxa de progresso ou as inflexões da curva de progresso e também pela própria teoria da sua construção, ou seja, de ser baseada no processo biológico da aprendizagem, demonstraram ser adequadas para estabelecer relações entre as variáveis estudadas e a incidência de ferrugem, de maneira a proporcionar melhor ajuste entre os dados observados e estimados.

Os menores EMP (1,17%) e QMD (3,43) foram obtidos para a RN elaborada com as variáveis produção (PD), umidade relativa (UR30), horas de insolação (IN30) e temperatura mínima (Tmi30), selecionadas pela análise de regressão 'stepwise' e relativas ao período de 30 dias anteriores à avaliação. A prevalência desse período pode estar relacionada com o período de incubação da ferrugem, o qual varia de 29 a 62 dias, principalmente em função de temperatura (Kushalappa & Chaves, 1980). A topologia dessa rede foi de 4-6-3-1.

A curva ajustada por valores obtidos da RN aproximou-se dos valores observados da incidência, enquanto os valores estimados pela equação de regressão não se ajustaram aos dados observados (Figura 2).


Redes neuronais e análise de regressão para descrever a incidência da ferrugem, utilizando simultaneamente variáveis climáticas selecionadas aos 15, 30, 45 e 60 dias antes de avaliar a doença

Nos modelos ajustados pela análise de regressão múltipla 'stepwise', as variáveis climáticas do período de 15 dias não foram incluídas. Essa ausência pode estar relacionada à duração mínima, tanto do período latente quanto de incubação, em torno de 30 dias. Foram selecionadas apenas as variáveis Tme30, DCP45, UR60 e IN60.

A seleção da variável temperatura, pode ser explicada devido a influência desse elemento de clima nas diferentes fases do ciclo das relações patógeno-hospedeiro (Ribeiro et al., 1978). Essa variável também foi identificada por Silva-Acuña et al. (1998), por análise de trilha, como explicativa da taxa de infecção da ferrugem para a região de Patrocínio, MG. A Tme, também correlacionada com a incidência de ferrugem por Talamini (1999), variou de 16,1 ºC a 23,6 ºC e está relacionada à germinação dos uredosporos de H. vastatrix, cuja temperatura ótima varia de 21ºC a 23,7ºC (Montoya & Chaves,1974; Akutsu, 1981). A importância dessa variável também foi ressaltada por Kushalappa & Chaves (1980), os quais demonstraram que os períodos de incubação e latente variaram de 29 a 62 dias e de 38 a 70 dias, respectivamente, em função da temperatura.

A inclusão das variáveis DCP e UR nos modelos pode ser justificada pela necessidade da presença de água livre para germinar os esporos (Kushalappa & Eskes, 1989; Silva-Acuña et al., 1998) e pela influência da chuva na disseminação dos uredosporos (Chaves et al., 1970; Chalfoun, 1997; Talamini, 1999).

O modelo ajustado pela regressão linear, teve maior coeficiente de determinação (R2 = 0,82) e valor do QMD baixo, embora tenha apresentado EMP alto. Valores altos de EMP e baixos de QMD, como no presente caso, indicaram erros no ajuste dos menores valores da incidência de ferrugem. A RN desenvolvida com as variáveis selecionadas pela regressão 'stepwise', apresentou os menores QMD (4,36) e EMP (2,43%) (Tabela 2).

Na avaliação de todos os períodos, a melhor rede para descrever a incidência da ferrugem foi elaborada com as variáveis Tme30, DCP45, UR60 e IN60, selecionadas pela análise de regressão múltipla 'stepwise' (Figura 3), embora em algumas datas, como 03/01/2001 o ajuste entre os dados observados e estimados pela rede não foram satisfatórios. Esses erros com certeza contribuíram para aumentar o QMD e o EMP. Nessa data, a diferença entre as repetições do experimento foram altas e podem ter contribuído para elevar o erro. O fato não ocorreu com a regressão pois se utilizou a média das repetições na elaboração dos modelos.


A predominância, no modelo, de variáveis relativas aos períodos de 45 e 60 dias anteriores à data de avaliação da doença pode ser justificada pela relação dessas com o período latente da ferrugem ¾ mínimo de 38 e máximo de 70 dias (Kushalappa & Chaves, 1980).

Redes neuronais para descrever a incidência de ferrugem a partir da série temporal

As RN apresentaram resultados satisfatórios para descrever a ferrugem a partir de séries temporais. Das cinco redes treinadas, o menor QMD foi obtido empregando-se os dados referentes à incidência da ferrugem nas cinco quinzenas anteriores à avaliação e o menor EMP, com os dados de quatro quinzenas (Tabela 3).

Os modelos ajustados pela análise de regressão apresentaram coeficiente de determinação crescente em função da inclusão de maior número de quinzenas. O melhor ajuste foi obtido para o conjunto de cinco quinzenas anteriores, o qual apresentou o maior valor de R2 e os menores de QMD e EMP. Para as RN também ocorreu redução nos valores do EMP e QMD com o maior número de avaliações (Tabela 3).

Como a ferrugem é doença policíclica, cuja epidemia apresenta taxas positivas e negativas de progresso durante o ano, o acompanhamento por um período mais longo permitiria avaliar melhor as variáveis descritivas da curva de progresso. Assim, provavelmente, os modelos ajustados com maior número de avaliações apresentaram melhores resultados devido à possibilidade de mudança nos valores da taxa de progresso.

A melhor rede para descrever a incidência da ferrugem foi a construída com os dados de incidência das quatro quinzenas anteriores (Figura 4), a qual apresentou QMD = 3,95 e EMP = 4,72%. O modelo ajustado pela regressão para esse período apresentou coeficiente de determinação 0,86 e quadrados médios dos desvios próximos aos obtidos com a rede. No entanto, o erro médio de previsão foi maior, quando comparado ao da rede. Nesse caso, os dados estimados tanto pela RN quanto pela equação de regressão apresentaram alto índice de ajuste aos dados observados (Figura 4).


As redes foram eficientes para descrever a epidemia a partir da série temporal da incidência da doença e podem constituir ferramenta alternativa para explicar a epidemia da ferrugem do cafeeiro. O emprego de séries temporais, baseado na incidência e na severidade da doença, pode facilitar descrever e até prever a epidemia da ferrugem. Avaliar a intensidade da doença é mais fácil para o produtor ou agente de extensão, quando comparada à coleta de variáveis climáticas. Além do mais, em muitas regiões produtoras ocorre variação climática ao longo da área de plantio. É o caso das regiões Sul e Zona da Mata de Minas Gerais, onde a topografia predominante é de montanha. Nesses casos seria necessário implantar sensores de coleta de variáveis climáticas ao longo do declive. Evidentemente, mais estudos serão necessários para aprimorar o modelo, como diferentes combinações de variáveis, inclusão de outras, tais como molhamento foliar noturno, tempo de precipitação, utilização de dados de outras regiões e emprego de maior número de dados. Apesar de RN serem úteis para descrever fenômenos e detectar padrões, os modelos fundamentais são de grande importância por permitirem usar variáveis extraídas de sistemas dinâmicos e reduzir o empiricismo.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Departamento de Engenharia da UFLA por ter possibilitado coletar os dados em experimento implantado e conduzido por seus professores e sempre colaborar com os nossos propósitos, principalmente o de integrar as diversas áreas da ciência.

  • AGRIANUAL - Anuário da Agricultura Brasileira. São Paulo: Ed. Agros Comunicação, 2001.
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    Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor. Universidade Federal de Lavras (2001).
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    Bolsista do CNPq
  • Publication Dates

    • Publication in this collection
      20 Feb 2003
    • Date of issue
      Sept 2002

    History

    • Accepted
      25 June 2002
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