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Fatores associados à ingestão de sal em pacientes em tratamento crônico de hemodiálise

Resumos

INTRODUÇÃO: A ingestão de sal tem sido diretamente relacionada ao aumento da ingestão hídrica e, consequentemente, ao incremento dos níveis da pressão arterial (PA) e do ganho de peso interdialítico (GPID), fatores de risco de morbimortalidade em pacientes em hemodiálise (HD). OBJETIVO: Avaliar a ingestão de sal e suas fontes alimentares, bem como sua associação com parâmetros demográficos, clínicos e nutricionais. MÉTODOS: Estudo transversal no qual participaram 109 pacientes (66% mulheres; idade = 49,0 ± 12,6 anos) de cinco centros de diálise. Para obtenção da ingestão de sal total, foi utilizado um questionário de frequência alimentar (QFA) validado somado à estimativa da ingestão de sal de adição. Os dados obtidos foram relacionados a diversos parâmetros. RESULTADOS: A ingestão de sal média foi elevada (8,6 ± 5,4 g/dia), sendo 72% proveniente do sal de adição. Apenas a escolaridade se correlacionou tanto com a ingestão de sal total (r = -0,29; p < 0,01) como com o sal de adição (r = -0,30; p < 0,01). Com o sal dos itens alimentares do QFA, houve correlação direta com o percentual de GPID (%GPID) (r = 0,26; p < 0,01) e inversa com a idade (r = -0,35; p < 0,001). Relação direta da ingestão de sal total com o %GPID foi encontrada no subgrupo de pacientes anúricos (r = 0,26; p < 0,05). Associação positiva da ingestão de sal total com a PA média (PAM) foi evidenciada apenas nos que não faziam uso de hipotensores (r = 0,35; p < 0,05). CONCLUSÃO: A ingestão de sal total foi elevada devido, principalmente, ao sal de adição. A mesma associou-se com a escolaridade e afetou adversamente o %GPID nos pacientes anúricos e a PAM nos que não utilizavam drogas hipotensoras.

diálise; ingestão de alimentos; sódio


INTRODUCTION: Salt intake increases fluid intake and, consequently, blood pressure (BP) and interdialytic weight gain (IDWG), known as morbi-mortality risk factors for hemodialysis (HD) patients. OBJECTIVE: Evaluate salt intake and food sources, as well as its relationship with demographics, clinical and nutritional parameters. METHODS: Cross-sectional study with 109 patients (66% women, age = 49.0 ± 12.6 years) from five dialysis centers. For total salt intake, a validated food frequency questionnaire (FFQ) and the use of discretionary salt were estimated. The relationship of salt intake with many factors was studied. RESULTS: Salt intake was high (8.6 ± 5.4 g/day) and 72% came from discretionary salt. Only literacy was significantly correlated total salt intake (r = -0.29, p < 0.01) and discretionary salt (r = -0.30, p < 0.01). With FFQ food items, there was a positive correlation with the %IDWG (r = 0.26, p < 0.01) and negative with age (r = -0.35, p < 0.001). Direct relationship between salt intake with %IDWG was found in the anuric subgroup (r = 0.26, p < 0.05) and with medium BP in those with no prescription of hypotensive drugs (r = 0.35, p < 0.05). CONCLUSION: Salt intake was high mainly due to discretionary salt. It was associated with education and adversely affected %IDWG in anuric patients and medium BP in those not taking hypotensive drugs.

dialysis; food consumption; sodium


ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

Fatores associados à ingestão de sal em pacientes em tratamento crônico de hemodiálise

Fabiana Baggio NerbassI; Jyana Gomes MoraisI; Rafaela Gonzaga dos SantosII; Tatiana Stela KrugerI; Andrea Carolina SczipII; Hercilio Alexandre da Luz FilhoI

IFundação Pró-Rim

IICentro de Tratamento de Doenças Renais

Correspondência para Correspondência para: Fabiana Baggio Nerbass Fundação Pró-Rim, Joinville, SC. Centro de Tratamento de Doenças Renais, Joinville, SC Rua Xavier Arp, nº 15 Joinville, SC, Brasil. CEP: 89227-680 E-mail: fabiana@prorim.com.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: A ingestão de sal tem sido diretamente relacionada ao aumento da ingestão hídrica e, consequentemente, ao incremento dos níveis da pressão arterial (PA) e do ganho de peso interdialítico (GPID), fatores de risco de morbimortalidade em pacientes em hemodiálise (HD).

OBJETIVO: Avaliar a ingestão de sal e suas fontes alimentares, bem como sua associação com parâmetros demográficos, clínicos e nutricionais.

MÉTODOS: Estudo transversal no qual participaram 109 pacientes (66% mulheres; idade = 49,0 ± 12,6 anos) de cinco centros de diálise. Para obtenção da ingestão de sal total, foi utilizado um questionário de frequência alimentar (QFA) validado somado à estimativa da ingestão de sal de adição. Os dados obtidos foram relacionados a diversos parâmetros.

RESULTADOS: A ingestão de sal média foi elevada (8,6 ± 5,4 g/dia), sendo 72% proveniente do sal de adição. Apenas a escolaridade se correlacionou tanto com a ingestão de sal total (r = -0,29; p < 0,01) como com o sal de adição (r = -0,30; p < 0,01). Com o sal dos itens alimentares do QFA, houve correlação direta com o percentual de GPID (%GPID) (r = 0,26; p < 0,01) e inversa com a idade (r = -0,35; p < 0,001). Relação direta da ingestão de sal total com o %GPID foi encontrada no subgrupo de pacientes anúricos (r = 0,26; p < 0,05). Associação positiva da ingestão de sal total com a PA média (PAM) foi evidenciada apenas nos que não faziam uso de hipotensores (r = 0,35; p < 0,05).

CONCLUSÃO: A ingestão de sal total foi elevada devido, principalmente, ao sal de adição. A mesma associou-se com a escolaridade e afetou adversamente o %GPID nos pacientes anúricos e a PAM nos que não utilizavam drogas hipotensoras.

Palavras-chave: diálise; ingestão de alimentos; sódio.

INTRODUÇÃO

O tratamento da doença renal crônica na fase dialítica é complexo e exige um envolvimento significativo do paciente a uma terapêutica que inclui cuidados com o acesso vascular, adesão às medicações prescritas e às orientações nutricionais, cujas recomendações incluem uma ingestão adequada de energia e proteínas e a restrição de potássio, fósforo, sódio e de líquidos.1 O controle da ingestão de sódio é necessário, pois este é o principal desencadeador da sede osmométrica, que ocorre quando o aumento da osmolaridade extracelular estimula os osmoreceptores hipotalâmicos,2 desencadeadores da sensação da sede e da consequente ingestão de líquidos. Em indivíduos saudáveis, o resultante aumento do volume extracelular é compensado pela excreção renal de sódio e líquidos para o restabelecimento do estado normal de hidratação,3 o que não ocorre com a maior parte dos pacientes em hemodiálise por apresentarem diurese residual mínima ou anúria.

Estima-se que em pacientes anúricos para cada 8 g de cloreto de sódio (sal de cozinha) ingerido, seja necessário 1 litro de líquidos para manter as concentrações de sódio sérico normais.4 Portanto, quanto maior a ingestão de sódio, maior será a de líquidos e, por conseguinte, o peso acumulado entre uma diálise e outra, o chamado ganho de peso interdialítico (GPID). O GPID corresponde à diferença entre o peso pós-diálise e o peso pré-diálise da sessão seguinte e está relacionado a complicações como hipertensão, insuficiência cardíaca congestiva e até morte.5,6 O %GPID superior a 5,7% foi associado a um aumento na taxa de mortalidade de 35%, independentemente de outros fatores de risco.6 Além das evidências indiretas da influência da ingestão de sódio na mortalidade em virtude da sua relação com o %GPID e da elevação da pressão arterial, uma publicação recente encontrou que uma maior ingestão dietética de sódio foi preditor independente de mortalidade entre 1770 pacientes em hemodiálise.7

Para promover a diminuição destes problemas, a recomendação do Guia de Nutrição Europeu é de que a ingestão de sódio seja de, no máximo, 2000 a 2300 mg ao dia ou 5 a 6 g de sal de cozinha (cloreto de sódio) e o GPID não deve exceder 4% a 4,5% do peso seco.4

Apesar da principal fonte dietética de sódio ser o sal de cozinha adicionado aos alimentos, muitos compostos e aditivos alimentares, como glutamato monossódico, benzoato de sódio, etc., têm sido amplamente utilizados pela indústria de alimentos e podem contribuir significativamente no aumento da ingestão de sódio. Em países industrializados, estima-se que 75% da ingestão de sódio seja proveniente de alimentos processados.8

Poucos trabalhos investigaram a ingestão e as fontes alimentares de sódio na população de pacientes em hemodiálise.

Assim, o objetivo deste estudo foi o de avaliar a ingestão e as fontes alimentares de sódio em pacientes em hemodiálise (HD), bem como sua associação com parâmetros demográficos, clínicos e nutricionais.

MÉTODO

PACIENTES

O desenho do estudo foi do tipo transversal e incluiu 109 pacientes que estavam em programa crônico de hemodiálise em duas unidades da Fundação Pró-Rim nas cidades de Joinville e Balneário Camboriú e em três unidades do Centro de Tratamento de Doenças Renais nas cidades de Joinville, Jaraguá do Sul e Mafra, todas em Santa Catarina. De um total de aproximadamente 400 pacientes nas cinco unidades, foram incluídos aqueles com idade superior a 18 anos, com tempo em tratamento hemodialítico superior a três meses e que costumavam fazer as principais refeições em sua residência. Foram excluídos pacientes com comprometimento cognitivo, os que não sabiam responder às questões para investigação da ingestão de sal e aqueles em que os dados coletados dos prontuários estavam incompletos ou apresentavam erros de digitação.

Pacientes foram também questionados quanto à sua escolaridade, que foi analisada em anos de estudo a partir do primeiro ano do ensino fundamental, uso contínuo de medicação hipotensora e diurese residual. Foram considerados anúricos os com diurese residual < 100 ml/dia. Todos os participantes tinham acompanhamento periódico com profissionais nutricionistas e eram orientados, tanto individualmente como por meio de aulas ministradas para grupos, a consumirem a quantidade adequada de sal (máxima de 6 g/dia).4 O trabalho foi aprovado pelos Comitês de Ética das Instituições envolvidas na pesquisa.

INGESTÃO DE SAL

Para a obtenção da ingestão total diário de sal, foi utilizada a somatória do sal de adição + sal dos alimentos do questionário de frequência alimentar (QFA). Ingestão superior a 6 g/dia foi considerada elevada.4

SAL DE ADIÇÃO

Pacientes foram questionados sobre o consumo mensal habitual de sal em sua residência (número de pacotes de 1 kg por mês), bem como sobre o número de pessoas que faziam as principais refeições (almoço e jantar) na residência pelo o menos cinco vezes na semana. A ingestão individual foi obtida dividindo-se a quantidade de sal consumida (em gramas) pelo número de comensais habituais.9

SAL DOS ALIMENTOS DO QUESTIONÁRIO DE FREQUÊNCIA ALIMENTAR (QFA)

O QFA utilizado foi validado previamente em nosso país9 e é composto por 15 itens de alimentos ricos em sódio frequentemente consumidos por indivíduos brasileiros. São eles: presunto, mortadela, linguiça de porco, linguiça de frango, salsicha, hambúrguer bovino, bacon, feijoada, sardinha enlatada, tempero tipo alho e sal, caldo em tablete, salgadinhos de pacote industrializados, macarrão instantâneo, lanche/hambúrguer (tipo fast food) e pizza. Os participantes foram questionados sobre o tamanho da porção e a frequência da ingestão de cada alimento no último ano, com as respostas variando de 1 = "nunca" a 7 = "duas ou mais vezes ao dia". Para cada alimento da lista, havia um fator de conversão do sódio, um número entre 0,01 a 1,00 derivado de tabelas de composição de alimentos que representava a quantidade de sódio consumida em 1 g do item alimentar. O conteúdo de sódio da porção média consumida por cada participante foi calculada multiplicando o peso da porção (em gramas) pelo fator de conversão. Finalmente, o sódio (em mg) da porção usual foi multiplicado pela frequência de ingestão e corrigida pela frequência da ingestão mensal (0 para a resposta 1 = nunca; 0,5 para a 2 = menos de uma vez por mês; 2 para a 3 = uma a três vezes por mês; 4 para a 4 = uma vez por semana; 12 para a 5 = duas a quatro vezes por semana; 30 para a 6 = uma vez ao dia; 60 para a 7 = duas ou mais vezes ao dia). O resultado era a ingestão de sódio mensal de cada item. Para obtenção da ingestão de sal mensal e diária, foi utilizada a equivalência de 400 mg de sódio = 1 g de sal.

%GPID E PRESSÃO ARTERIAL

O %GPID foi calculado em relação ao ganho real de peso entre uma sessão e outra de HD utilizando-se a seguinte fórmula:

Foi considerado adequado %GPID < 4,5%.4

A pressão arterial pré-HD era mensurada após o paciente estar sentado por um período mínimo de cinco minutos. Para análise tanto do %GPID como da pressão arterial (PA), foi calculada a média obtida das sessões de hemodiálise no período de quatro semanas. Para a análise dos dados de PA, foi calculada a pressão arterial média (PAM) por meio da fórmula:

PAM até 107 mmHg foi considerada adequada por corresponder aproximadamente a uma PA de 140/90 mmHg.10 Os dados foram coletados dos prontuários dos pacientes.

AVALIAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL

Como indicador de estado nutricional foi utilizado o índice de massa corporal (IMC), obtido pelo peso (kg) dividido pela estatura ao quadrado (cm). Foi utilizado o peso seco, que é definido de acordo com critérios clínicos (pressão arterial, presença de edema, sintomas intradialíticos) e revisado periodicamente pela equipe multidisciplinar. IMC superior a 23 kg/m2 foi considerado adequado.4

ANÁLISE ESTATÍSTICA

A análise estatística foi realizada utilizando o software SPSS, versão 13.0 para Windows (SPSS, Inc. Chicago, IL). Os resultados foram expressos em média e desvio padrão, mediana e extremos ou em percentuais, quando adequado. Para análise de correlação, utilizou-se o teste de Pearson ou Spearman de acordo com a distribuição das variáveis. Para comparação das variáveis entre os grupos, foi utilizado o teste t de Student. A significância estatística foi considerada para valores de p < 0,05.

RESULTADOS

Características da amostra estudada estão apresentadas na Tabela 1. Os pacientes incluídos eram em sua maior parte do sexo feminino e o percentual de participantes tanto com %GPID elevado quanto com PAM inadequada era de aproximadamente 25%.

A média da ingestão de sal diária foi elevada (8,6 ± 5,4 g/dia) e 58% dos participantes relataram um nível considerado inadequado (> 6 g/dia). Conforme demonstrado na Figura 1, o sal de adição contribuiu com 72% da ingestão total de sal, enquanto que os alimentos do QFA tiveram uma participação menos expressiva. Temperos a base de sal e os tabletes de caldo foram responsáveis por 63% da ingestão atribuída aos itens do QFA.


A ingestão total de sal não foi diferente entre os gêneros, mas a proveniente dos alimentos do QFA foi maior no sexo masculino (3,5 ± 5,3 versus 1,8 ± 2,2 g/dia; p < 0,05). Quando comparados de acordo com a escolaridade, pacientes com nível superior ao ensino fundamental relataram menor ingestão de sal total (6,7 ± 4,4 versus 9,7 ± 5,6 g/dia; p < 0,05) e de adição (4,7 ± 2,6 versus 7,1 ± 4,3 g/dia; p < 0,05) que os demais. Não houve qualquer diferença quando a ingestão de sal foi comparada em virtude da idade (ponto de corte = 60 anos) ou do estado nutricional pelo IMC (ponto de corte = 23 kg/m2).

No grupo completo de pacientes, a escolaridade foi a única variável que apresentou correlação significativa tanto com a ingestão de sal total (r = -0,29; p < 0,01) como com o sal de adição (r = -0,30; p < 0,01). Com o sal dos itens alimentares do QFA, houve correlação direta com o %GPID (r = 0,26; p < 0,01) e inversa com a idade (r = -0,35; p < 0,001). Relação direta da ingestão de sal total com o %GPID foi encontrada somente no subgrupo de pacientes anúricos (r = 0,26; p < 0,05) e com a PAM apenas no de participantes que não faziam uso de hipotensores (r = 0,35; p < 0,05).

Ao dividirmos a amostra de acordo com o %GPID, pacientes com %GPID elevado relataram maior ingestão de sal total e dos alimentos do QFA e a média da PAM também foi significativamente maior que dos participantes com %GPID adequado. Não houve diferença quando comparamos os grupos de acordo com a adequação da PAM ou da ingestão de sal total (Tabela 2).

DISCUSSÃO

O presente trabalho evidenciou que pacientes em hemodiálise apresentaram uma ingestão elevada de sal que se associou ao %GPID, PAM e à escolaridade.

Ingestão inadequada de sal também foi encontrada em outros dois estudos realizados em pacientes em hemodiálise em nosso país. Na pesquisa de Vasconcelos et al.10 a ingestão estimada foi de 8,6 ± 2,9 g e na de Agondi et al.,11 cuja metodologia de avaliação foi a mesma utilizada nesta investigação, foi de 10,6 ± 6,3 g/dia. Ingestão de sal semelhante à encontrada neste estudo foi a estimada para a população brasileira por meio da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) realizada entre os anos de 2008 e 2009: 8,2 g/dia.12

Ao contrário do que ocorre em países desenvolvidos, nos quais a ingestão de sódio provém principalmente de alimentos industrializados (75%),8 em nosso estudo a principal fonte de ingestão deste eletrólito foi do sal de adição (72%). Agondi et al.11 encontraram contribuição ainda mais significativa do sal de adição na ingestão de sal total (82%). No mesmo trabalho, os temperos à base de sal também tiveram a maior participação na ingestão de sódio dentre os alimentos do QFA.

A ingestão de sal e sua relação entre as mais diversas características foram pouco explorados tanto na população de pacientes em hemodiálise ao redor do mundo, como na população em geral do nosso país. No presente trabalho, dentre as variáveis demográficas estudadas, a única que influenciou a ingestão de sal total foi a escolaridade. Correlação inversa com esta variável também foi encontrada por Agondi et al.11 Esta associação pode ter ocorrido devido ao menor esclarecimento sobre a utilização do sal dentre os pacientes com nível de escolaridade inferior.

A presença ou não de diurese influenciou a relação entre a ingestão de sal com o %GPID, pois correlação direta entre estas variáveis foi encontrada apenas no grupo de pacientes anúricos. Diferentes resultados foram evidenciados em outros trabalhos, que encontraram esta relação com o grupo total de pacientes, independente da diurese.7,11 Associação do sal total no %GPID foi também evidenciada quando a amostra foi dividida de acordo com a adequação do mesmo. Pacientes com %GPID inadequado relataram maior ingestão de sal que os demais.

A relação entre ingestão de sal total e a PAM foi observada somente no grupo de pacientes que não faziam uso de drogas hipotensoras continuamente. Esta mesma associação, mas com a pressão arterial sistólica, foi encontrada em um estudo que envolveu 1770 pacientes, independentemente do uso de anti-hipertensivos.7

Evidências das vantagens da restrição de sal em pacientes em hemodiálise foram apontadas por estudos que encontraram diminuição do GPID e da necessidade de medicação hipotensora, melhor preservação da função ventricular esquerda, além de diminuição dos episódios de hipotensão intradialíticas.10,13,14 Porém, foi demonstrado que lidar com a restrição hídrica é um dos componentes mais estressantes do tratamento destes pacientes.15 De fato, mais da metade dos pacientes estudados relataram ingestão de sódio inadequada e um quarto apresentaram %GPID elevado.

Estudos que utilizaram teorias comportamentais de saúde como o modelo transteorético (transtheoretical model) e o modelo de crenças em saúde (health belief model) avaliaram as diferenças entre os pacientes com relação à predisposição à adesão à restrição de sódio e hídrica e as principais barreiras e benefícios percebidos pelos mesmos em aderirem a estas recomendações. Como resultados, encontraram que indivíduos que apontam mais benefícios estão mais propensos a serem aderentes, ao contrário daqueles que consideram um maior número de barreiras. 16,17 Smith et al.1 conduziram um trabalho em que pacientes em hemodiálise foram reunidos em pequenos grupos para discussão sobre a percepção dos mesmos em relação às barreiras e facilitadores da adesão à restrição hídrica. Dentre as barreiras, os fatores psicológicos foram os mais relatados, sendo a falta de motivação um dos principais. Já entre os fatores facilitadores, o conhecimento foi o mais abordado pelos pacientes, seguido por fatores psicológicos positivos como autoconfiança e suporte social

Em um estudo conduzido em nosso país, no qual as crenças em relação à restrição de sal foram investigadas em 117 pacientes em hemodiálise, foi observado que os indivíduos percebiam mais benefícios do que barreiras em seguir esta orientação. Dentre os benefícios, os mais apontados foram: "alimentos salgados não são bons para mim" e "comer menos sal vai preservar a saúde do meu coração". As barreiras mais relatadas foram "comer pouco sal dificulta ir a restaurantes" e "alimentos com pouco sal não são saborosos".11 Para esses estudiosos, o melhor entendimento das crenças dos pacientes em relação à restrição de sal e hídrica é uma ferramenta importante para aumentar a eficácia das intervenções e a adesão terapêutica por meio das modificações comportamentais que se fazem necessárias.1,11,17

CONCLUSÃO

Os resultados deste trabalho mostraram que são necessárias intervenções para aumentar a adesão à restrição de sal, já que esta se associou adversamente ao GPID e à pressão arterial, fatores que aumentam consideravelmente a morbimortalidade destes pacientes.

Data de submissão: 13/08/2012.

Data de aprovação: 14/02/2013.

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  • Correspondência para:

    Fabiana Baggio Nerbass
    Fundação Pró-Rim, Joinville, SC. Centro de Tratamento de Doenças Renais, Joinville, SC
    Rua Xavier Arp, nº 15
    Joinville, SC, Brasil. CEP: 89227-680
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      13 Ago 2012
    • Aceito
      14 Fev 2013
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